quarta-feira, 13 de maio de 2009

A primeira favela (continuação)

Continuação do Capítulo I...

Decidi, então, seguir para a outra rua do roteiro que eu havia traçado, para cumprir outro mandado, que era para intimar uma testemunha de acusação. Caminhei por cerca de meia hora, até chegar ao local em questão. Nessa rua existia uma pequena favela, cujo nome constava do mandado. Lá chegando, perguntei a uma pessoa se aquela era a favela Tal. Ele me respondeu que sim, mas completou de uma forma suave:

- Só que nós não chamamos de favela, chamamos de “comunidade”.

Eu disse o nome da pessoa que deveria ser intimada e perguntei se ele conhecia. Novamente ele disse que sim e apontou a casa dela. Era um barraco de madeira, situado no final de um caminho sem saída, já dentro da “comunidade”. Lá chegando, bati à porta. Ninguém atendeu. Bati palmas, e apareceu uma vizinha. Perguntei:

- Boa dia, eu gostaria de falar com a senhora Fulana, ela mora nessa casa?
- Sim, ela mora. Ela não está aí?
- Acho que não, pois ninguém apareceu.

Entreguei então uma papeleta para a vizinha, dizendo que era para a senhora Fulana ir me procurar no fórum. Ela recebeu a papeleta com uma certa desconfiança, perguntou o que era aquilo exatamente. Eu disse que era apenas um recado, com meu nome, o endereço do fórum e o horário em que a senhora Fulana poderia me encontrar. Expliquei que se tratava apenas de testemunha em um processo criminal. A vizinha, olhando a papeleta em suas mãos, perguntou-me:
- Moço, eu não vou ficar envolvida por causa disso?

Surpreso, eu disse que não. Insisti que era apenas um recado, nada mais. Dei as costas e fui embora, antes que ela mudasse de idéia.

Dirigi-me a uma avenida, onde eu iria pegar outro ônibus, para chegar em outra rua. Parei em um boteco no meio do caminho para beber uma coca-cola. Cheguei na avenida e procurei o ponto de ônibus. Não vi nenhum e segui para um dos lados, na esperança de encontrá-lo. Cruzei com uma pessoa e perguntei:

- Onde tem um ponto de ônibus nesta avenida?

A pessoa me respondeu, indicando um local onde havia duas pessoas paradas:

- É ali.

Fui para lá e fiquei esperando. Passou meia hora e o ônibus não veio. Chegou uma mulher com uma criança pequena e ficou cantando um hino evangélico ou coisa assim. Finalmente o ônibus chegou, eu entrei e fui para a frente, pois iria descer em pouco tempo. Cheguei no local que eu avaliei seria próximo da rua que deveria ir e desci. Caminhei em direção à rua, seguindo o mapa do guia.

Cheguei ao local e vi que era um bar. Com o mandado na mão, perguntei pelo senhor Fulano. O rapaz que estava no balcão me respondeu:

- É o meu irmão, mas ele não trabalha aqui, deve estar em casa. O que você quer com ele?

Respondi que eu tinha uma comunicação do fórum, sem dar detalhes. É que se tratava de uma sentença condenatória. Perguntei onde era a casa do senhor Fulano e o rapaz se prontificou a ir comigo até lá, que ficava na mesma rua.

Chegando na casa, o senhor Fulano atendeu à porta e seu irmão foi embora. Eu disse ao senhor Fulano, destacando a cópia do mandado com a sentença:

- Saiu a sentença, preciso que o senhor assine aqui.

- Que sentença?

- A sentença do seu processo.

Ele olhou a sentença, já nervoso, e disse, em um misto de surpresa e indignação:

- Mas eu sou testemunha, isso está errado!

- Eu não sei, apenas faço intimações, quem sabe é o juiz. Preciso apenas que o senhor assine aqui e coloque a data.

- Mas não pode, eu sou testemunha...

Olhei então a sentença e entendi. Tratava-se de uma condenação por falso testemunho. Tentei explicar para ele o que era e vi que ele sabia exatamente o que se passava quando respondeu:

- Vou falar com meu advogado.

Ele assinou e eu guardei o mandado na minha pasta. Subi a rua em direção à avenida para pegar outro ônibus e ir ao fórum.

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